Brasil concentra 76% dos incêndios na América do Sul

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O Brasil registrou 5.132 focos de incêndio nas últimas 24 horas, representando 75,9% das áreas afetadas pelo fogo em toda a América do Sul, segundo dados do Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O Cerrado, com 2.489 focos, ultrapassou a Amazônia, tornando-se o bioma com o maior número de incêndios recentes.

Ane Alencar, diretora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e uma das principais especialistas no tema, expressou preocupação com o avanço dos incêndios, destacando a antecipação do período crítico de queimadas. Ela teme que a situação piore após setembro, semelhante ao que ocorreu em 2022, quando os incêndios aumentaram significativamente em outubro e os primeiros sinais de chuva só chegaram em janeiro.

Nos primeiros dias de setembro de 2024, o número de focos de incêndio é mais que o dobro do registrado no mesmo período de 2023. Até o momento, foram registrados 37.492 focos, em comparação com 15.613 no ano anterior. Ane Alencar atribui essa escalada ao efeito combinado de fenômenos climáticos como El Niño e La Niña, o aquecimento global e a ação humana. Ela ressalta que o Brasil está enfrentando secas simultâneas em vários biomas, criando uma “tempestade perfeita” que favorece a propagação dos incêndios.

Além da Amazônia e do Pantanal, São Paulo também enfrenta uma situação crítica com o aumento dos focos de incêndio.

Ignição
Para a pesquisadora, embora a seca seja capaz de causar impactos na economia e no equilíbrio ambiental, com isolamento de comunidades, dificuldades de transporte e mortandade de espécies, ela não é capaz de causar fogo e a proporção de seu impacto ganha maiores dimensões pela ação humana. “Para que haja um fogo, tem que ter faísca, que é essa primeira fonte de ignição, e ela é iniciada pelo ser humano, por diversos motivos. Mas os principais, eu diria, porque a gente está falando de uma região muito grande, os principais são o uso do fogo para renovação de pastagem e o uso do fogo na prática de conversão do solo, na prática de desmatamento”, afirma Ane.

Qualidade do ar
O cenário de incêndios em grande parte do país faz com que os episódios críticos de poluição do ar também sejam mais frequentes e as doenças causadas pela fumaça impactem, inclusive, o sistema de saúde do país. Recentemente, o Ministério da Saúde acionou a Força Nacional do Sistema Único de Saúde (FN-SUS) para atuar no auxílio aos estados e municípios em busca de minimizar os efeitos das queimadas na saúde humana.

Ane Alencar explica que os efeitos regionais do fogo vão muito além das questões de saúde e afetam até a economia de um país. “Há um impacto para as pessoas que perdem suas matérias-primas, aquela árvore frutífera, aquela madeira que está ali na floresta; há um impacto na caça das pessoas. E também na agropecuária, uma área que não estava preparada para ser queimada, quando é queimada tem efeito na agricultura. Também o gado tem que sair daquele pasto queimado e ir para outro, que vai ser arrendado ou, às vezes, o gado até morre”.

As perdas não param por aí segundo a pesquisadora, que também aponta impactos na ciência, no meio ambiente e no bem-estar da humanidade. “Tem impactos que vão desde a perda de biodiversidade, de material genético que a gente até desconhece, a diminuição da capacidade de recuperação dessas áreas, que ficam mais suscetíveis a outros incêndios. Isso faz com que se tenha uma perda de serviço ecossistêmico, principalmente de água, mas também de retenção de carbono, por exemplo. Outra questão é do calor mesmo, sabemos que a floresta tem papel importante no conforto térmico”.

Conscientização
Embora em grande parte das áreas atingidas pelos incêndios o manejo do fogo esteja proibido, a pesquisadora considera que ainda é necessário melhorar a conscientização das pessoas. “Do jeito que estamos vivendo essa crise, os contingentes governamentais, sejam eles da esfera federal, estaduais, ou municipais, não serão suficientes para conter o que está ocorrendo, a não ser que haja o engajamento da sociedade”, diz.

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