Livro reA?ne 200 depoimentos de pessoas que curtiram a dA�cada do desbunde na BA
Idealizado pelo produtor cultural SA�rgio Siqueira e pelo escritor Luiz Afonso, o livro Anos 70 Bahia serA? lanA�ado nesta terA�a, A�s 17h30, no restaurante PA?studo, no Rio Vermelho
A�O jornalista Nelson Cadena senta-se em um banco na PraA�a da Piedade. Morou ali, na rua mesmo, por conta prA?pria, em meados da dA�cada de 1970. Mais de 40 anos depois, de volta ao lugar em que passou noites a fio, ele senta-se, ajeita os A?culos e suspira. AlA�m das recordaA�A�es que pipocariam na mente e no peito, estampava outras duas marcas daqueles tempos: a camisa florida e o resto da cabeleira. Um dos personagens do livro Anos 70 Bahia – que serA? lanA�ado nesta terA�a-feira (04/04), a partir das 17h30, A�no restaurante PA?studoA�- Cadena foi hippie dos mais viscerais.
a�?Eu era um hippie pobre. Colhia cogumelo na ilha porque nA?o tinha dinheiro para comprar maconhaa�?, disse, com vestA�gios de sotaque castelhano. a�?Fazia meu chA? de cogumelo e ficava de boa. Depois vim para Salvador morar uns tempos na ruaa�?, lembrou o colombiano, que chegou na Bahia com 19 anos e, antes da Piedade, viveu em uma cabana que ele mesmo construiu na Ilha de Itaparica.
Fato real ou pura vertigem? NA?o se sabe. Na verdade, para boa parte daquela geraA�A?o, tudo o que diz respeito A�queles tempos A� pura vertigem. Prova disso sA?o as histA?rias, entorpecidas com boas doses de erva, amor, cogumelo, sexo, A?cido, rock nA?roll e liberdade. Agora, muitas dessas memA?rias alucinantes e alucinadas estA?o disponA�veis para quem quiser ler. EstA? tudo em Anos 70 Bahia (Corrupio).
Concebido pelo produtor cultural SA�rgio Siqueira e pelo escritor Luiz Afonso, a publicaA�A?o A� um documento escrito por quem experimentou na pele – e no cA�rebro – os anos 70 em Salvador e outros picos de loucura e lisergia, como Arembepe e Itaparica. ColetA?nea de depoimentos publicados no Facebook, o livro reA?ne histA?rias de 200 colaboradores da pA?gina homA?nima A� publicaA�A?o.
Famosos
Gente que contraria a mA?xima: a�?Se vocA? se lembra dos anos 70 A� porque nA?o estava lA?a�?. Dada A� riqueza de detalhes de algumas histA?rias, eles se lembram, sim. Os autores discorrem, por exemplo, sobre o dia em que o ator Robert de Niro passou o seu aniversA?rio, como anA?nimo, no Restaurante Berro dA?A?gua, no Porto da Barra. Charles MocA?, dono do Berro, levou um susto quando soube que sua foto estava estampada em uma revista de circulaA�A?o nacional. Na verdade, a figura mais importante da foto era De Niro, clicado por um fotA?grafo que estava na A?rea. Mas se o ator fosse descoberto por MocA?, pouco mudaria.
a�?No Berro, era proibido pedir autA?grafo a artista. Artista esperava mesa como um simples mortal!a�? narra comentA?rio de Charles Pereira no livro. Na pA?gina seguinte, Luiz Jasmin lembra da noite em que ali jantou com Michael Douglas.
A� que, a�?no esplendor dos anos 70a�?, muitas estrelas passaram pela Bahia. De Niro e Douglas preferiram o Porto da Barra, territA?rio de Caetano Veloso nos verA�es. a�?O Porto era o start, onde tudo comeA�avaa�?, descreveu Eva Cristina. a�?Na A�poca do lindo sonho delirante, o Porto era a casa de todosa�?, destacou DiA?genes Moura. a�?Era um sonhoa�?, resumiu Ivonete Moniz Pacheco.
Mas tantos outros astros visitaram tantos outros lugares por aqui. Anos 70 Bahia nA?o podia deixar de tratar de episA?dios clA?ssicos, como a passagem de Janis Joplin, em marA�o de 1970, quando ficou hospedada na casa de Martins, no Rio Vermelho. a�?Janis visitou o Mercado Modelo, tomou banho de mar de topless, entornou muita pinga e tequila, e, como era comum na A�poca, LSD e marijuanaa�?.
E o sem nA?mero de artistas que visitaram Arembepe? Em uma sA? foto, Jack Nicholson, Roman Polanski, Jessel Buss e Denis Hopper passeiam no paraA�so. Em outro momento, Mick Jagger e Keith Richards compraram um imA?vel chamado Casa do Sol no local. Diferente de Roman Polanski e seus amigos, nA?o se misturaram com os nativos. a�?Fizeram um RA�veillon fantA?stico por lA?a�?, narra o livro.
A�Arembepe A� um capA�tulo A� parte. Muitos relatos das viagens e loucuras regadas a A?cido. Por lA? passaram tambA�m os Novos Baianos e Tim Maia, que a�?ajudou um dos biriteiros da regiA?o a consumir algumas das 156 garrafas de cachaA�a Saborosa, pelas quais trocou sua Kombi velhaa�?. Mas era o tempo do LSD: a�?VocA? encontrava pessoas na rua de Arembepe viajando com aqueles olhos arregaladosa�?, contou Missival. Tudo isso com a ditadura militar correndo solta.
Nudez
Eram tambA�m tempos de nudez. Fotos como a de Ney Matogrosso nu, por entre a vegetaA�A?o, resumem bem a liberdade em que se podia circular na Aldeia Hippie. a�?Arembepe: toda nudez serA? exaltadaa�?, resume o tA�tulo de um dos capA�tulos. Arembepe tornara-se, entA?o, um dos paraA�sos hippies do mundo.
Era o nosso santuA?rio mor. Mas, mesmo em Salvador, outros lugares fizeram a cabeA�a da malucada. Muitos hippies e outros entusiastas da contracultura migraram para bairros como Boca do Rio, Alto da Sereia e PituaA�u, por exemplo. E os points culturais? Eram muitos. Do Icba, a�?territA?rio livre das artesa�? A� Concha AcA?stica.
Os memorA?veis shows dos Novos Baianos eram grandes baratos coletivos. Foi em um deles que o artista argentino Fernando Noy, um dos representantes do desbunde em Salvador na A�poca, fez uma performance tA?o louca que o show parou. a�?As pessoas viraram de costas para o palco para assistir Noy. Baby se retou e falou no microfone: a�?VocA?s preferem a gente ou a bichaa��. A plateia inteira: a�?A bicha, a bichaa��a�?, conta SA�rgio Siqueira.
Vinicius de Moraes
Os carnavais eram catarses coletivas. a�?HA? Jacu no pau!a�?, anunciou, logo na estreia, o bloco do Jacu em uma faixa. Todo mundo em cana. RepressA?o! Mas Salvador respirava arte, cultura e mA?sica. Essa imagem ficou ainda mais forte quando VinA�cius de Moraes veio morar na Bahia. a�?Para desagrado e ciumeira no circuito boA?mio-cultural do Rio e SA?o Paulo, Vinicius chegou A�no inA�cio dos anos 70, importado pela atriz Gessy Gessea�?.
A�A casa do casal, A�em ItapuA?, tornou-se ponto de romaria de turistas. Sobre isso, a prA?pria Gessy fez comentA?rio impagA?vel no Facebook: a�?A coisa chegou, assim, A�quele ponto em que Vinicius se bandeava para a casa de Elsimar Coutinho, em frente, e lA? ficava sentado na varanda degustando seu uisquinho. Gritavam, chamavam, batiam(…) VinA�cius chegava a crises de risos(…)a�?.
Aqui, conta o livro, Vinicius se enturmou com Jorge Amado, Dorival Caymmi, CarybA�, JoA?o Ubaldo e MA?e Menininha do Gantois. AlA�m, A� claro, dos tropicalistas. a�?Caetano e Gil voltavam do exA�lioa�?, lembrou SA�rgio Siqueira. Com essa trupe por aqui, a�?desequilibrou de vez a balanA�a da artistagem no paA�s. Esse deslocamento de eixo consolida a Bahia como a�?o lugara�� no paA�s, nos anos 70a�?, contextualiza Luiz Afonso. Ou seria pura vertigem?
Livro nasceu a partir de postagem no Facebook
Anos 70 Bahia teve uma criaA�A?o tA?o espontA?nea quanto aqueles anos dourados. a�?ComeA�ou em uma brincadeira. Postei fotos dos anos 70 no Facebook em dezembro de 2014. Veio uma enxurrada de fotos de outras pessoas. Coloquei textos e surgiram muitos outros textos. Uma receptividade incrA�vel. AA� criei uma pA?gina especA�fica. Prontoa�?, explica o produtor cultural SA�rgio Siqueira, que assina a autoria do livro com o escritor Luiz Afonso. Mas, para Anos 70 Bahia virar realidade, foi preciso pedir ajuda aos amigos. Sem verba, atA� uma vaquinha on line foi feita. Foram arrecadados R$ 5 mil.
Com o projeto consolidado, a FundaA�A?o Pedro Calmon se tornou um dos apoiadores. Os depoimentos estA?o na A�ntegra, como foram postados no Facebook. a�?Um livro que trata dos anos 70 nA?o pode ser censuradoa�?, afirma. Algumas imagens que deveriam estar no livro A� que nA?o foram publicadas, como a imagem de Mick Jagger com sua famA�lia tocando violA?o em Arembepe – no livro estA? apenas uma A�reproduA�A?o em desenho. a�?Ficamos com receio de algumas imagens por conta dos direitos autoraisa�?, explica SA�rgio Siqueira.
ServiA�o
Livro: Anos 70 Bahia
Organizadores: SA�rgio Siqueira e pelo escritor Luiz Afonso
Editora: Corrupio
PreA�o: R$ 40 (232 pA?ginas)
LanA�amento: nesta terA�a (04/04), 17h30, no PA?studo, Rio Vermelho.
Fonte: Correio